Conheça os direitos trabalhistas do corretor de seguros
A principal lei que rege os direitos trabalhistas é a CLT, Consolidação das Leis do Trabalho. Já em seu início, a CLT define no artigo 2º o conceito de empregador, e no artigo 3º o conceito de empregado.
O conceito de EMPREGADO se difere do que seria um TRABALHADOR AUTÔNOMO ou terceirizado, pois o empregado possui vínculo trabalhista com a empresa, o que lhe confere diversos direitos (carteira assinada, FGTS, férias, 13º, horas extras, etc.), que não são previstos para o trabalhador autônomo.
Por isso, muitos empregadores decidem fraudar a legislação trabalhista, contratando o trabalhador como se fosse autônomo (muitos corretores, inclusive, são pressionados a constituir pessoa jurídica), ainda que o trabalho seja, na realidade dos fatos, de empregado. Dessa forma, o empregador deixa de pagar os direitos trabalhistas conferidos pela CLT.
Portanto, é importante que o trabalhador saiba diferenciar se o trabalho exercido é realmente autônomo ou se constitui como vínculo de emprego.
Para que o trabalhador saiba identificar se sua atividade se caracteriza como vínculo de emprego, deve ser observado o artigo 3º da CLT, que define os requisitos para a condição de EMPREGADO: "Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário."
Como se nota, para ser considerado empregado a pessoa precisa prestar serviços (I) de natureza não eventual, (II) sob a dependência deste e (III) mediante salário.
Melhor explicando, o primeiro requisito (“não eventualidade”) significa o serviço prestado de forma não eventual, ou seja, com habitualidade, com uma certa frequência predeterminada pelo superior (chefe, patrão, supervisor, ...).
O segundo requisito (“sob a dependência deste”) significa subordinação, ou seja, o trabalhador não possui autonomia ou liberdade nas decisões de trabalho, estando dependente das decisões da empresa para atuar. Assim, se a empresa estabelece horários, cobra assiduidade, fixa metas, pune o trabalhador, certamente há o elemento de dependência ou subordinação.
Por último, o terceiro requisito é autoexplicativo (“mediante salário”) e se trata de serviço prestado de forma onerosa, ou seja, mediante pagamento.
Como se percebe, para identificar se a relação é de emprego ou de trabalho autônomo, é necessário verificar a existência, principalmente, da presença de HABITUALIDADE e SUBORDINAÇÃO na prestação dos serviços.
Um trabalhador AUTÔNOMO possui independência; não possui chefe; estabelece as próprias metas; trabalha nos dias e horários que desejar; e presta serviço eventual.
Já um trabalhador EMPREGADO não possui autonomia nas decisões; obedece a ordens superiores; se obriga a comparecer em dias e horários estabelecidos, sob pena de punição; é cobrado por metas; e presta serviço de forma habitual.
Como exemplo, um corretor de seguros pode ser autônomo, caso ele atue de forma independente, com metas próprias, sem obrigação de cumprir horários fixados por seguradora ou instituição financeira, realizando vendas de seguros para clientes de variadas instituições, sem precisar estar presente na agência ou vinculado a um supervisor/gerente por diversos dias na semana.
Porém, se o corretor de seguros é obrigado a cumprir metas impostas pela seguradora e/ou instituição financeira, presta contas de produtividade para superior, tem obrigação de cumprir horários e trabalha para a seguradora ou instituição financeira habitualmente, não pode enviar substituto em seu lugar ou faltar sem justificar, então estamos diante de relação de emprego, conforme art.3º da CLT.
E, nesse último caso, se a relação entre corretor e seguradora/banco é de emprego, sem autonomia ao corretor, o securitário deve ter a carteira assinada e todos os direitos conferidos, como pagamento de FGTS, 13º salário, férias, seguro-desemprego, etc.
Em muitos casos, infelizmente, o securitário está formalizado como corretor autônomo, contudo, na realidade dos fatos, trabalha como empregado da seguradora ou instituição financeira, com habitualidade e subordinação.
Nesses casos, o securitário tem o direito de pleitear o reconhecimento da realidade dos fatos, que prevalecem sobre a formalidade que consta nos papéis. Se, na prática, o securitário trabalha com habitualidade e subordinação, sem autonomia, pode pedir ao Judiciário o reconhecimento da fraude em sua contratação e pleitear seus direitos de empregado.
Quando o empregador contrata o trabalhador formalizando “papelada” que demonstraria autonomia (como contrato na SUSEP, abertura de pessoa jurídica, constituição de franquia, ...), mas, na realidade, cobra habitualidade e impõe subordinação, a formalidade é considerada fraude e o empregado, ao ter o vínculo de emprego reconhecido, deve ter a carteira assinada.
Concluindo, há relações de trabalho entre corretores de seguro e seguradora e instituições financeiras que podem ser considerados trabalho autônomo ou vínculo de emprego.
Se o corretor for autônomo (estabelecer suas próprias metas, atuar de forma independente, puder se fazer substituir por outro, não precisar cumprir horários e estratégia da empresa, ...) não possui direitos trabalhistas previstos na CLT, como intervalo intrajornada (almoço), depósitos de FGTS, pagamento de 13º salário, férias, etc.
Entretanto, quando o trabalho é exercido com habitualidade e subordinação se caracteriza como vínculo de emprego e, por consequência, a carteira de trabalho deve ser assinada, conferindo-se ao trabalhador todos os direitos previstos na lei.
Abaixo, para exemplificar, seguem algumas decisões judiciais que reconheceram o vínculo de emprego entre corretor de seguros e seguradora/instituição financeira.
Jurisprudência
(Decisões Judiciais sobre vínculo de emprego corretores/securitários)
"(...) Como se observa, a realidade fática vivenciada pelas partes demonstra que a reclamante tinha total subordinação jurídica e estrutural junto à reclamada, não se amoldando à hipótese o simples franqueamento de serviços, pois a prestação de serviços se dava diretamente em favor da reclamada, com prestação de contas diretas, através de gerentes da empresa, sem possibilidade de substituição e com efetivação do poder diretivo em caso de aplicação de punições. (...) Portanto, uma vez não demonstrada a autonomia na prestação de serviços, bem como porque a reclamante logrou demonstrar a efetiva existência de vínculo de emprego entre as partes, não há que se falar em violação ao art. 3º, da CLT.(...)"
(TRT-2 10011188520195020021 SP, Relator: IVETE BERNARDES VIEIRA DE SOUZA, 17ª Turma - Cadeira 4, Data de Publicação: 07/12/2020)
"RELAÇÃO DE EMPREGO. CORRETOR DE SEGUROS CONTRATADO SOB A FORMA DE FRANQUIA. FRAUDE. CONTRATO DE TRABALHO CONFIGURADO. Para a configuração da relação empregatícia, indispensável é a constatação da presença concomitante dos pressupostos fático-jurídicos estabelecidos nos arts. 2º e 3º da CLT, quais sejam, trabalho prestado por pessoa física, com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e subordinação jurídica. (...) configurada, na prática, a relação de pessoalidade e dependência/subordinação, malogrando o objetivo da lei, que assim não pode ser evocada para elidir a configuração do vínculo empregatício."
(TRT-3 - RO: 00103403920205030019 MG 0010340-39.2020.5.03.0019, Relator: Marcio Toledo Goncalves, Data de Julgamento: 07/04/2022, Decima Primeira Turma, Data de Publicação: 08/04/2022.)
"CORRETOR DE SEGUROS. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O art. 17 da Lei nº 4.594/64 veda a formação de relação de emprego entre o corretor e a empresa seguradora. Todavia, esta vedação não impede o reconhecimento do vínculo empregatício se não houver autonomia na condução dos negócios de corretagem, haja vista o princípio da primazia da realidade, segundo o qual a realidade dos fatos prevalece sobre a forma no âmbito laboral. Presentes os elementos caracterizados do vínculo. Arts. 3º e 9º da CLT. Recurso improvido."
(TRT-7 - RO: 00017294220175070003, Relator: JOSE ANTONIO PARENTE DA SILVA, Data de Julgamento: 21/09/2020, 3ª Turma, Data de Publicação: 21/09/2020)
"CORRETOR DE SEGUROS. AUSÊNCIA DE AUTONOMIA. RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE EMPREGO. Demonstrado nos autos que a autora, sob a roupagem formal de corretora de seguros autônoma, atuava como verdadeira empregada da empresa seguradora, estando presentes todos os elementos configuradores do vínculo de emprego previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, inclusive a subordinação jurídica, há de ser mantida a decisão de origem que reconheceu a relação empregatícia. Fica afastada, portanto, a contratação de forma autônoma, nos moldes da Lei nº 4.594/1964. Nesta hipótese, não cabe também cogitar de terceirização de serviços, autorizada pelo ordenamento jurídico, consoante entendimento firmado pelo STF no RE nº 958.252."
(TRT-3 - RO: 00101869820215030176 MG 0010186-98.2021.5.03.0176, Relator: Sebastiao Geraldo de Oliveira, Data de Julgamento: 23/11/2021, Segunda Turma, Data de Publicação: 24/11/2021.)
"RECURSO ORDINÁRIO. MATÉRIA COMUM AOS RECURSOS DA RECLAMANTE E DAS RECLAMADAS VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CORRETOR DE SEGUROS. CONFIGURAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. (...) In casu, restando comprovado que a prestação de serviços ocorreu de forma subordinada, permanecendo a Reclamante à mercê da direção e fiscalização das Reclamadas, que fixava metas, promovia reuniões para definição de estratégias, a manutenção da Sentença que reconheceu o vínculo empregatício havido entre as partes, na condição de securitária, é a medida que se impõe. Sentença mantida, no aspecto."
(TRT-20 00004653020175200002, Relator: JOSE AUGUSTO DO NASCIMENTO, Data de Publicação: 31/01/2022)
"CORRETOR DE SEGUROS. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. SEGURADORA. Comprovada a fraude mediante a imposição do empregador para que fosse constituída empresacomo condição para exercer a função de corretor de seguros e, reunidos os elementos previstos no art. 3º, da CLT, correta a sentença que reconheceu o vínculo empregatício entre o obreiro e a seguradora."
(TRT-1 - RO: 00000823120115010054 RJ, Relator: Maria Aparecida Coutinho Magalhães, Data de Julgamento: 22/07/2014, Oitava Turma, Data de Publicação: 06/08/2014)
"CORRETOR DE SEGUROS. AUSÊNCIA DE AUTONOMIA. VÍNCULO DE EMPREGO COM A SOCIEDADE SEGURADORA. RECONHECIMENTO. (...) O objetivo da norma legal é o de assegurar a efetiva autonomia do corretor em face das sociedades seguradoras, para a proteção dos interesses dos clientes, e não o de convalidar fraudes perpetradas para mascarar a relação de emprego, com o intuito evidente de sonegar do empregado os direitos trabalhistas. Incide, na hipótese, o Princípio da Primazia da Realidade, para fazer prevalecer o que sucede no terreno dos fatos, e não o que emerge dos documentos formalmente apresentados."
(TRT-3 - RO: 00104006420175030165 0010400-64.2017.5.03.0165, Relator: Convocado Vitor Salino de Moura Eca, Oitava Turma)
"CORRETOR DE SEGUROS. VÍNCULO DE EMPREGO COM A SEGURADORA. Preenchidos os requisitos da relação de emprego nos moldes dos arts. 2º e 3º da CLT, impõe-se o reconhecimento do liame empregatício."
(TRT-1 - RO: 00118208920145010028, Data de Julgamento: 13/02/2017, Terceira Turma, Data de Publicação: 24/02/2017)